Educar os filhos, está aí uma tarefa difícil,
instigante e trabalhosa. Guardando as particularidades de cada época, nunca foi
diferente disso. Pergunte aos antigos. Lembro-me muito bem de minha mãe se
desdobrando para educar quatro filhos, todos na fase escolar, com diferença de
aproximadamente dois anos para cada um. O quarto filho, um temporão, tornou a
tarefa ainda mais desafiadora. Agora, não me lembro que ela tinha a sua
disposição um manual de orientações sobre a educação de filhos. Fazia tudo com
amor, disciplina e claro anulação de si. O repertório de habilidades que
possuía, vinha da observação nada empírica do jeito de ser de cada filho e suas
demandas. Na observação, ela era capaz de perceber o humor de cada um e o que
era necessário para equilibrar o emocional de cada filho. Meu pai, como os
homens da época, não possuía essas habilidades. Era um excelente provedor,
disciplinador e pouco afetivo.
Esses quase 35 anos na educação e minha
experiência como pai, me leva ao entendimento que quem faz a opção de ter
filhos naturais ou do coração, adota o mais difícil dos desafios, pois é uma
tarefa que geralmente partimos para ela sem uma estratégia clara e nem uma visão
panorâmica do terreno, mais ou menos com a postura intuitiva e otimista que
assumimos diante de outras situações da vida. Aprende-se com a prática. Não há,
de fato, outra maneira. Nesse sentido, aí é que mora o problema. Até que essa
prática seja dominada...contudo, há uma certeza: lidar com os filhos anuncia um
conjunto totalmente novo de solicitações e mudanças em nossas vidas, exigindo
que renunciemos a muitas coisas conhecidas e que assumamos outras tantas
desconhecidas. Talvez seja melhor assim, pois cada filho fundamentalmente é
único.
Em se tratando de educação de filhos, outro
aprendizado com os meus três filhos e com os muitos alunos que passaram por
minha vida: a mesma coisa que fizemos ontem, até ontem, tinha dado certo, mas
não necessariamente, vai funcionar hoje. Precisamos estar muito sintonizados no
presente para sentirmos o que a situação exige. Por isso, eu sempre digo que
não há uma fórmula de sucesso no que se diz método para criar filhos. É
incrível como tudo muda, inclusive o juízo de valores que fazemos das
situações. Essa necessidade de estarmos nos adequando sempre, é, sem dúvidas o
que faz da tarefa de educar filhos a mais provocante de todos os nossos
desafios. Portanto costumo dizer que a educação dos filhos é um trabalho
singularmente pessoal. É uma prática que vem do íntimo de cada um de nós e por
isso mesmo o estilo adotado por outra pessoa de nada nos vale. Precisamos é de
criar um estilo nosso de acordo com a personalidade de cada filho nosso, visto
que cada um, é um. Respeitar as individualidades dos filhos e confiar em nossa
bagagem familiar e cultural, em nossos instintos humanos e em nosso coração, é,
com certeza, um bom caminho para nos conduzir com sucesso na educação de nossos
filhos.
Vivemos em uma cultura contemporânea
extremamente líquida, onde não se valoriza muito educar os filhos. A
modernidade líquida, conceito do sociólogo polaco Zygmunt Bauman, atesta que
essa “cultura líquida moderna”, dissolveu os valores mais nobres da humanidade
e, numa relação líquida, inconsistente, propiciou a globalização, o consumo e o
relacionamento nas redes sociais. Essa modernidade
líquida, não é mesmo o melhor lugar para que consigamos com sucesso absoluto a
educação de nossos filhos, pelo menos nos padrões de uma outra época. Por isso
o nosso espanto. Creio que estamos com dificuldade de nos situarmos nesse mundo
aquoso, sem a solidez com a qual estamos acostumados por conta de nossa
educação. Tal realidade nos provoca a buscarmos a compreensão do mundo de nossos
filhos, a partir de experiências que eles estão vivendo e não com as
experiências que nós carregamos. Assim, precisamos de entender o universo no
qual nossos filhos estão vivendo para que, com as ferramentas pedagógicas mais
atualizadas, possamos exercer essa tarefa de educar bem para a vida.
Certamente há coisas boas e razões para se
ter esperança. Em todos os meus atendimentos e minha vivência de pai e
educador, testemunho que há maneiras calorosas e criativas de orientarmos os
filhos e nos aproximarmos deles. Tenho registros pessoais e profissionais que
esforços de pessoas imaginativas e comprometidas com a sua missão de pais,
resultam em impactos definitivamente significativos na vida de seus filhos. Uma
educação comprometida com o amor, com a compreensão e pautada em um
relacionamento mútuo de respeito, opera milagre na vida de qualquer um. Saber
que cada filho é um ser e que o que é bom para o irmão ou para o filho do
vizinho não necessariamente cabe a todos, é tratar cada um, como um ser único
que de fato somos.
Fonte:
BAUMAN,
Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro, ed. Zahar. 2003