segunda-feira, 8 de maio de 2017

A adolescência tardia



Um final de semana desses, encontrei, quando passeava na orla da Ponta verde, um amigo que também é pai de um aluno de nossa Escola. Conversamos demoradamente sobre o momento atual do país, a situação política e econômica em que vivemos e o reflexo disso no humor das pessoas.
Sem compromisso, observamos que o grau de descontentamento das pessoas é tão grande, que todos estamos muito irritados. Perdemos a paciência com muita facilidade e toda essa irritação tem provocado um enorme estresse até mesmo nas relações interpessoais.
Mas, por que estou lhe participando isso?  Ocorre que a nossa conversa foi para a experiência dos filhos, alunos, escola, crise da adolescência...
O referido amigo mostrou-se preocupado com os sinais da adolescência no filho. O pior, foi que se assustou quando eu disse que há hoje, entre os educadores e especialistas, a constatação de que a adolescência é um comportamento que está se prolongando e muito. Não é um período entre a puberdade e a idade de 18 anos como se classificou um dia. A adolescência está mais demorada, os filhos estão cada vez mais imaturos e permanecendo por mais tempo em casa. Surpreso, ele me pediu para escrever algo sobre o tema. Assim, aqui eu faço um breve ensaio a respeito.
A psicanálise tem nos ensinado que uma das tendências mais marcantes da pós-modernidade é a efemeridade, a fragmentação, a descartabilidade e a inexistência de padrão dominante. Essa pós-modernidade é, aos olhos dos especialistas, uma sociedade centrada no lazer, na aparência, na imagem, no consumo, além do desinvestimento nas relações vinculares. (Vaitsman – 1194).
Há em nossa sociedade pós-moderna a vivência de um sentimento de descontinuidade do ser na medida em que se busca essencialmente valores externos e não o viver criativo. Certamente, nesse contexto, o “amadurecimento” afetivo e social dos jovens em formação, torna-se perene, atrasado, de forma que ainda é comum encontrarmos muitos jovens aos 20 e 30 anos, com precária subjetividade. Quer dizer, ainda “imaturos”, sem a construção de um eu e sem as respostas que são essenciais para o entendimento do mundo. Na verdade, é comum ainda a pergunta: “quem eu sou?”
O que temos hoje é o surgimento de uma nova geração entre as tantas que já foram denominadas. Especialistas a classificam como a “Geração Canguru”. Ela se caracteriza pela experiência de demora dos filhos em sair de casa. Há jovens, com idade entre 25 anos e 34 anos, que preferem ficar na casa dos pais, mesmo já estando no mercado de trabalho. O que eles não querem, é perder a segurança da casa dos pais, enquanto ainda estão se preparando mais para o exigente mercado de trabalho. Fazer mestrado, doutorado, MBA, cursos de especialização e conquistar a desejada segurança externa tem segurado os filhos em casa. Também a dificuldade de se colocarem no mercado de trabalho, os altos custos da independência e o conforto que encontram são fatores de fixação por mais tempo na casa dos pais. Esse comportamento torna-os mais “garotões” e, por isso, aparentemente menos responsáveis. Se pensarmos que outro dia, os jovens (já com 18 anos) estavam prontos para iniciar a vida independente. Aí é que ficamos preocupados com o comportamento de nossos filhos. Eu mesmo, sou de uma geração que o aniversário de 14 anos era um marco de maturidade, que nos colocava em um patamar de “homenzinhos”, até nas roupas mesmo. Hoje, os jovens da “Geração Canguru” até têm preparo intelectual, mas são carentes de preparo emocional para saírem de casa.
Mas de onde vem isso? Ora, vem do modelo de sociedade que temos aí construído nessa dita pós-modernidade. Jovens que cresceram sob a proteção exagerada dos pais, com medo da violência das cidades grandes, compensando-os com presentes devido à ausência deles, que se separam a toda hora ou que tem que trabalhar e muito para garantir o sustento dos filhos. São resultado da superproteção de pais na escola, no condomínio, nos ambientes sociais. Ficam em casa, presos aos jogos eletrônicos que desenvolvem os neurônios, mas dificultam o desenvolvimento da inteligência emocional e a capacidade de relacionamento, resolução de conflitos, de desafios que vencidos geram confiança, como ganhar uma corrida, um jogo de futebol ou um queimado. Falta-lhes ter vencido o medo de subir em uma árvore, correr, cair e se curar com a própria saliva as escoriações expostas. Esse modelo atual de sociedade está transformando os nossos jovens em pessoas que encontram dificuldades em enfrentar o mundo. Sabemos que ele não anda fácil. Tenho os meus filhos na adolescência e sei o quanto tem sido difícil dar a eles essas oportunidades. Contudo eu me esforço. Os problemas deles com os colegas, com as dificuldades na escola, precisam ser resolvidos por eles. Não interfiro. Questões de relacionamentos etc, são por eles resolvidas. Posso e devo orientá-los, mas não interferir. A escolha profissional que estão fazendo partiu de cada um e eu apoio e incentivo. Se estão com dificuldades em algo, oriento-os no sentido de enfrentarem, mas não os protejo. Jamais! Não serei eterno e eles crescerão.
O que precisamos é de encontrarmos um meio termo nessa questão. Deixar de lado a superproteção já pode ser um bom caminho. Despertar neles o desejo do desafio também, mas acima de tudo, levá-los a entender que precisam crescer para o mundo. Tem sido muito confortável ficar na casa dos pais, mas eles precisam entender a necessidade da construção de seus próprios mundos. Caso contrário, serão eternos adolescentes, dependentes de nosso conforto e sem a independência necessária para a realização na vida.
Precisamos estar atentos à atualidade, que é marcada por mudanças subjetivas que acabam por influenciar as relações entre os sujeitos, nas quais os ideais presentes, que serviam de balizadores, já não existem mais. Os limites não estão muito claros, ou talvez, já não existam mais. É o tempo da flexibilidade e da fluidez das relações, lugar de vínculos enfraquecidos, como nos ensina Bauman (2004). O sujeito enfraquecido, o “eu” não formatado, acaba desaguando crianças que foram superprotegidas e por isso não conseguiram se encontrar, para fazer a passagem para a maturidade. Esbarraram na adolescência e inconscientemente prolongaram essa experiência pelo conforto de não ter tido forças para enfrentar a vida. Não podemos aceitar isso para os nossos filhos e filhas.


Nenhum comentário:

Postar um comentário