segunda-feira, 15 de junho de 2015

Uma criança pode suportar todas as verdades



Muitas vezes, os pais se recusam a revelar aos filhos algo a respeito da história deles. Acreditam que isso prejudicará os filhos. É importante salientar aqui, que os nossos filhos têm muita força para encarar qualquer verdade. Precisarão dessa verdade para enfrentar o mundo com capacidade de superarem tudo. Não pode haver dificuldade em contar aos filhos a sua história ou mesmo a história dos pais e familiares.
Recentemente participei de um seminário online (ah... esse mundo digital, está tudo assim...) denominado de “Seminário de Psicanálise Infantil”, patrocinado pela minha associação. Um tema discutido que muito me chamou a atenção, foi: “Pais mentem por amor”. Nesse debate a questão central era: seria saudável mentir aos filhos sobre algo de sua história ou da história da família por amor aos filhos? Essa suposta “proteção” do emocional dos filhos é mesmo o melhor caminho? Na verdade não! As crianças podem sim suportar todas as verdades, desde que haja entre pais e filhos uma relação de respeito e confiança.
O que está sendo vivido no ambiente familiar, ficará registrado no inconsciente da criança, independente da idade. Tentar esconder uma verdade, não significa que teremos sucesso, pois os filhos possuem a capacidade de perceberem tudo. Sabemos que há na história de vida das crianças, muita absorção de tudo o que vivenciam no seu dia-a-dia. Por isso, precisamos dar atenção a dois fatos muito presentes no universo familiar: a separação de casais e a adoção de filhos. Há muitas dúvidas se devemos ou não falar para os filhos sobre a separação. Algumas mães tendem a dizer que o pai está viajando ou “inventar” outra justificativa, acreditando assim evitar fazê-los sofrer. Negar o que se passa e principalmente o que sente naquele momento, pode gerar sequelas enormes. Pior ainda, é dar espaço para que as crianças saibam por outra pessoa. Aí pode-se despertar a sensação de traição por parte dos pais. Portanto, é preciso que as crianças estejam cientes do que está acontecendo. Com certeza, os filhos tem o direito de saber e a verdade é o melhor. Claro que não precisam saber nada além da decisão e os pais tem que ser capazes de não colocarem os filhos no centro do problema.
Quanto a questão da adoção: os filhos adotivos precisam saber da verdade? Sei que o medo de perder a aproximação leva os pais à omissão. O ideal é tratar o assunto com maturidade e de forma afetuosa para evitar frustrações. Adotar uma criança, é um lindo ato de amor e bem sei que o amor transcende a carga genética e a verdade é que todos nós sabemos disso, até mesmo os filhos adotivos! O amor supera tudo! Por isso, o quanto antes contarmos aos filhos sobre a adoção, melhor será a compreensão. Os pais precisam contar que são “pais de coração”. Eles devem ser os primeiros a contar aos filhos essa verdade. A experiência conta que a “verdade” de alguma forma já é percebida pela criança, está no inconsciente. Manter a adoção em segredo por toda vida, é muito difícil e sofrido, especialmente para os pais e, claro, existe a possibilidade da criança, mesmo quando adolescente ou adulto vir a saber através de outra pessoa. Especialistas são unânimes: a criança tem o direito de conhecer a sua história de vida. O ideal é que o assunto seja tratado o mais cedo possível e de forma natural.


segunda-feira, 1 de junho de 2015

Ser “certinho” é sempre um bom sinal?



“Não se pode ser sem rebeldia” é o que o grande educador Paulo Freire nos ensinou. A rebeldia em crianças e adolescentes é natural. Nós, pais e educadores temos a missão de transformar essa rebeldia em algo útil e interessante.
Ao longo de minha carreira como educador e principalmente nos últimos 4 anos, tenho ouvido muitos pais de alunos, notadamente aqueles cujos filhos estão entrando na adolescência, insatisfações com o comportamento dos filhos. Tenho constatado que a preocupação dos familiares está exatamente na adequação escolar. É muito comum a queixa envolvendo dificuldade na aprendizagem e também indisciplina. Na verdade, tudo faz parte do ambiente escolar, pois é nesse ambiente que as crianças e os adolescentes são colocados diante de novos desafios. Aprender, ser avaliado em sua aprendizagem e conviver o tempo todo com um enorme contingente de pessoas, é de fato um desafio grande. Como as crianças e adolescentes ainda não estão prontos em sua maturidade é claro também que a escola torna-se um lugar onde os conflitos acontecem.
É muito comum no ambiente educativo, crianças e adolescentes se “comunicar” com os adultos através de comportamentos “adequados” ou “inadequados”. O comportamento é uma forma que encontram para se expressar, tornando visível algo invisível. Muitas vezes possuem comportamento social diferente em casa. É muito comum ouvir dos pais: “em casa ele não é assim”. É verdade, podem mesmo ter comportamento diferente. Como eu disse, é na escola que são desafiados o tempo todo e são obrigados a conviver sob regras específicas e também com pessoas diferentes. Em casa, tudo é mais tranquilo no que tange as relações humanas. É na escola que muitas vezes as pessoas exteriorizam as vivências emocionais internalizadas durante o processo de desenvolvimento da personalidade, e as heranças culturais e éticas recebidas através de gerações.
Como as crianças e os adolescentes comunicam-se com os adultos através de manifestações comportamentais é fácil de se entender que tanto o aluno “certinho” ou “não certinho”, estão sim dando sinais que necessitam ser “lidos”. Como eu sempre digo, o aluno chega na escola não como um livro em branco. Ele não vem só. Traz consigo uma história de vida, vivências emocionais e culturais que certamente aqui na escola se revelam. Lidar com todo esse universo, exige de nós educadores mais do que experiência. Exige habilidades e competências no campo da psicopedagogia e capacidade de lidar com conflitos diversos. Mas, a família tem um importante papel na “leitura” dessa forma de comunicação de crianças e adolescentes, pois é o espaço das primeiras vivências afetivas responsáveis pela formação de modelos identificatórios e da personalidade de cada um.
Ser “certinho” é sempre um bom sinal? Depende. Precisamos estar atentos ao comportamento super adequado de alguns. Muitas vezes a obsessão pela perfeição, pelo excelente resultado na escola e para os cuidados exagerados com os pertences pode ser também sinais de uma inadequação. Pode ser defesa ou mesmo uma “autopunição”, produto de uma necessidade enorme de compensar algo ou mesmo de ser aceito por um determinado grupo. Claro que desejamos ter filhos “certinhos” mas, não neuróticos e angustiados. Num referencial psicanalítico, a angustia pode se transformar num sintoma, que por sua vez, contém um significado. Ela pode ser canalizada e expressada de maneira construtiva ou destrutiva para o próprio sujeito. Pode gerar um comportamento considerado adequado ou inadequado, para um determinado contexto.
O meu objetivo nessa breve reflexão é deixar claro a você pai e mãe, que mesmo sendo a criança ou o adolescente “certinho”, pode haver algo que denuncia um estado emocional. Por isso, não devemos nos prender a modelos de pessoas, mas sim a cada pessoa no sentido de estarmos atentos aos sinais que elas enviam, quando se comunicam conosco através das múltiplas linguagens que utilizam para nos dizer o que estão sentindo.

Bibliografia:
Blay Levisky. R. (2000) Possíveis relações entre a psicodinâmica familiar e o processo de aprendizagem. V congresso Bras. De Psicopedagogia. Livro do congresso. São Paulo. Brasil.