terça-feira, 4 de abril de 2017

Minha criança não sai da frente do computador



É constante a preocupação de pais e educadores com a permanência das crianças na frente de um computador ou dispositivo qualquer. Fala-se nisso demais e eu mesmo já tratei esse tema em um artigo encaminhado aos pais. Contudo, proponho aqui um aprofundamento na discussão. Esse comportamento é mesmo prejudicial para as crianças e adolescentes? Em que sentido? Qual deve ser a atitude dos pais? Vamos construir um raciocínio capaz de elucidar esses questionamentos. Para tanto, estarei me baseando em “olhares” psicanalíticos a respeito do tema.
Eu faço uso constante dessa tecnologia em minha vida. Utilizo o computador para trabalhar, escrever e mesmo para me comunicar com a família que hoje está fora. Utilizando-se de meu smartfone, acesso as redes sociais, consigo a transmissão de imagens e conversas com todos em tempo real. É uma maravilha. De certa forma, eu assumo que estou exposto a um tempo enorme à frente das tecnologias e nas redes sociais, me beneficiando de tudo de bom que posso usufruir. Em meu caso particular, utilizo toda essa ferramenta em benefício do meu trabalho e minha comunicação. Portanto, para mim, o computador em si é apenas um instrumento que pode ser usado de maneira saudável. Então a pergunta é: o que torna o uso do computador prejudicial? A resposta depende do número de horas em que a criança ou adolescente passa na frente de uma tela, roubando o tempo das atividades que são necessárias ao bom desenvolvimento físico e social, bem como ao bom desempenho escolar. Se a criança ou jovem deixa de brincar, praticar esportes, ir ao cinema, ler um livro, estudar etc, por estar exageradamente “enfiado” em uma tela de computador ou qualquer dispositivo, aí sim temos um grande problema. Se ele ou ela está demasiadamente se relacionando com pessoas no mundo virtual, criando fantasias com a imaginação ou mesmo deixando de lado o mundo real para viver o mundo virtual, aí temos um enorme problema instalado.
Um perigo muito grande é a criança e o jovem começarem a viver um descompasso entre o mundo real e o virtual. As fronteiras entre as duas realidades podem se tornar confusas e aleatórias. Isso é um problema, pois quanto menor for a maturidade do usuário, mais real ele achará o mundo virtual. Tudo em suas mãos, via internet. Isso quer dizer que, para alguns, viver o mundo virtual pode então ser mais interessante do que viver o mundo real. Mais rápido, mais sofisticado e mais interessante. Os encantos das redes sociais faz de qualquer um, uma pessoa popular, cheia de amigos envolvidos em momentos deliciosos com postagens que só mostram lugares lindos e festas. Reparem o perigo... O mundo virtual nos leva a um mundo de felicidade. Não há cobranças ou limites, como no mundo real. Tudo é extraordinário. Pode se comprar, assistir a um show, baixar músicas, jogar, conhecer parceiros e parceiras, postar ideias... tudo é possível. Esse mundo é mais sedutor e gostoso de se viver. Para as crianças e jovens a sensação de estarem em um mundo real quando acessam a internet é muito grande. Aos poucos, ele vai se alienando do mundo real e se isolando dele.
A expressão extremada da existência virtual é o site Second Life, em que os usuários podem mesmo construir uma nova vida, uma nova identidade (nickname), com perfil de personalidade nova. Pense no tamanho do problema... aqui eu tenho a desconstrução de uma personalidade real e a construção de uma personalidade virtual desejada. No campo psíquico, o descompasso do que é vivido na realidade e o que é criado no virtual, cria desvios que levam a mente humana a trabalhar mais próxima do funcionamento psicótico, com uma possível sensação de onipotência e uma tendência ao isolamento narcísico. Claro que tudo isso nos leva a entender que precisamos, sim, limitar aos filhos a utilização excessiva dessa maravilha. Fala-se hoje no surgimento de novas doenças, as ligadas às tecnoneuroses. Então, há perigo e nós devemos estar atentos. Devemos estar atentos ao isolamento deles, a falta de vontade de brincar e se relacionar socialmente. Precisamos dialogar para vermos se estão vivendo em um mundo paralelo ou estão conosco no mundo real. Precisamos estar atentos para não perdermos os nossos filhos para essa virtualidade, pois há perigos ocultos que envolvem sedução e mentiras nas redes sociais. O mundo virtual possui encantos que podem levar os perigos a todos, inclusive os que nem ainda ouvimos falar, perigos silenciosos que operam em nossa mente.
Para você conhecer mais o que tem sido discutido sobre a vida de nossos filhos e tudo o que envolve o seu psíquico, eu sugiro a leitura do livro “Perguntas a um Psicanalista”. Ele foi escrito por Roberto Girola e editado pela editora Ideias Letras.